Homens e mulheres pelados na tela da TV Globo! A estreia da sétima e última temporada do Amor & Sexo, que discutia a nudez, trouxe um grupo de dançarinos totalmente nus no palco. A rápida cena foi o suficiente para movimentar as redes sociais e o debate nos lares brasileiros: houve quem considerou um absurdo [“fazem de tudo pela audiência”], houve quem achou normalíssimo [“estava dentro da proposta”] e houve até quem considerou uma quebra de tabus – o jornalista Mauricio Stycer, do UOL, declarou que a cena mostra uma vontade da Globo em discutir limites. Será mesmo?
O fato é que a nudez explícita [pênis e vagina] ainda hoje choca e é castigada na TV aberta – mesmo quando feita após a meia noite. O motivo? “A nudez está muito ligada ao sexo e, desde sempre, foram apontadas todas as baterias contra a sexualidade humana porque, controlada a sexualidade das pessoas, controlavam-se as pessoas”, explicou a sexóloga Regina Navarro na atração. Porém, se por um lado a tevê condena a nudez e a considera só para maiores de 18, por outro ela explora contraditoriamente cenas que induzem sexo [de roupa] em horário livre. Qualquer exemplo de banhos, pegações e tapa-sexo de 0,5 cm não é mera coincidência ou menos excitante.
A contradição da classificação existe, porque, embora a nudez seja explícita, o corpo humano não deveria ser tabu. Todos nascemos nus e o corpo em si não é vulgar ou sexualizado – como foi o caso do “Amor & Sexo”. Porém, a censura da TV assemelha-se à do Facebook, que bane fotos de uma mãe com os seios de fora amamentando o filho e contraditoriamente permite fotos de poses ginecologicamente sexuais e de roupa na rede. Ou seja, nem todo corpo nu tem contexto sexual. E nem toda pessoa vestida é pudica O que ocorre nos últimos anos é um encaretamento notório, uma hipocrisia imensurável, a contínua falta de educação sexual e um abandono de corpos livremente nus desde os anos 80 – a década em que se podia quaaase tudo.
Infelizmente, acabaram-se as aberturas do tipo Tieta [Globo, 1989], em que Isadora Ribeiro aparecia artisticamente nua na praia. Acabou Maitê Proença tomando banho de cachoeiras em Dona Beija [1986, Manchete], com direito a cavalcar nua em cima de um cavalo. E chegou ao fim as polêmicas cenas de nudez de Xica da Silva [1996, Manchete], com Taís Araújo, com Adriane Galisteu e homens peladões. Para quem não sabe, até Roberta Close se desnudou em Mandacaru [Manchete, 1997], durante um banho no rio. A nudez fazia mais parte de um contexto leve e natural que as bundas vestidas chacoalhando na tevê atualmente.
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Isadora Ribeiro em Tieta, Maitê Proença em Dona Beija e Roberta Close em Mandacaru |
Adriane Galisteu e Taís Araújo em Xica da Silva, e Taiguara Nazareth em Presença de Anita |
BUNDAS MASCULINAS USADAS E CENSURADAS
Na ala masculina, os bumbuns [e apenas os bumbuns!] sempre escaparam vez outra, com muita rapidez e geralmente sem contexto sexual – mas de humorísticas fugas e perseguições. Nas tramas Globais, principalmente nas de Carlos Lombardi, o derrière de Claudio Henrich e Humberto Martins, em Uga-Uga [Globo, 2000], e Carlos Bonow e Marcos Pasquim em O Quinto dos Infernos [Globo, 2002] apareceram fofamente. O galã Ricardo Tozzi mostrou o bumbum em Insensato Coração [2011], assim como Dudu Azevedo em Duas Caras [2007] e Malvino Salvador em Fina Estampa [2011]
Até hoje, contudo, nada superou a repercussão dos icônicos derrières de Edson Celulari na minissérie Dona Flor e Seus Dois Maridos [Globo, 1998], de Victor Fasano na novela Barriga de Aluguel [1990] e de Thiago Lacerda em Hilda Furacão [Globo, 1998] e Celebridade [Globo, 2003], que ultrapassaram quase duas décadas e até hoje são lembrados com grande euforia.
Nos últimos anos, o bumbum mais comentado foi o de Thiago Fragoso, em O Astro [2011], seguido de Rodrigo Lombardi. Porém, o frisson [e a audiência crescente] em torno da bunda alheia foi tão grande que gerou uma ordem interna e absurda para cortar e limar qualquer homem nu das futuras cenas. E olha que nenhuma delas eram relacionadas a sexo: Thiago aparecia nu para confrontar o pai e Rodrigo durante um banho. O mesmo não aconteceu com as mulheres que estavam prestes a se despir com muito mais sensualidade e cenas de prostituição do Bataclan. Ai, esse machismo de todo dia…
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Claudio Henrich viveu o índio Tatuapu e ficou a novela inteira desnudo |
Humberto Martins, Carlos Lombardi, Ricardo Tozzi, Dudu Azevedo e Marcos Pasquim |
Bumbum de Thiago Fragoso deu o que falar e foi a deixa para proibir outros bumbuns |
SEIOS, MUITOS SEIOS
Graças às atuais novelas das 23h, os seios e as bundas voltaram a aparecer com a intenção de roubar o sono – de acordo com a classificação etária é possível ver um corpo nu depois das 22h. E, depois de Thiago, foi a vez dos corpos femininos serem explorados na novela Gabriela [2012], de Walcyr Carrasco. Ora puritana e ora explorando corpos nus e sexualizados, a novela trouxe as atrizes Juliana Paes, Suzana Pires, Leona Cavalli e as outras meninas do Bataclan desnudas frequentemente para cenas quentes de amor, sexo, striptease e silicones expostos. Apesar dos vários peitinhos, foi bem soft e delicado perto do que poderia ser…
Do grupo feminino, as censuras [ou vetos] recentes ocorreram em Presença de Anita [Globo, 2001], quando Mel Lisboa apareceu nua em pelo. E em 2011, ao reexibir a trama Mulheres de Areia no Vale a Pena Ver de Novo, em que a direção decidiu desfocar a nudez de Mônica Carvalho na abertura da novela. A justificativa foi essa: “Tendo como base seus princípios e valores, a Globo resolveu adaptar a abertura, tornando menos explícitas cenas de nudez. Embora a abertura tenha ido ao ar em 1993, a emissora avaliou que não era compatível com os padrões morais atuais do país”.
O fato é que, apesar de as emissoras terem a liberdade de classificar as produções e escolher o que quer ou não passar, o Ministério da Justiça mantém o exercício do Departamento de Classificação Etária, que tem o direito de reclassificar as obras. Já castigaram, por exemplo, as cenas de sexo [pra lá de sem graças] protagonizadas por Mariana Ximenes e Tony Ramos em Duas Caras, reclassificando a novela de 10 para 12 anos. Pode isso? [Confira, no fim do texto, as regras da Classificação Etária].
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Juliana Paes na pele de “Gabriela” [2012] |
Vanessa Giácomo, Suzana Pires e Bruna Linzmeyer |
NOS REALITY SHOWS
Nos reality shows, Alexandre Frota quebrou a regra do banho de roupa logo na estreia da Casa dos Artistas [2002, SBT] – e foi seguido por Flávio [Casa 2], Alan Pierri [BBB7], Diego Alemão [BBB7] e Lucas Barreto [A Fazenda de Verão]. Ao contrário deles, as mulheres eram [e continuando sendo] fiscalizadas a cada banho e a cada troca de roupa. Há olhares atentos para os “descuidos” e há também uma cobrança pública e higienizadora para que elas sejam “respeitosas” com a família brasileira e com o “papel de mulher”.
Quando Solange Vega, do BBB4 [2004], tirou a blusa e exibiu os seios para trocar de roupa na estreia, houve quem a criticasse. Quando Andressa Urach tirou a roupa para manifestar contra as finalistas de A Fazenda 6 [Record, 2013], o xingamento foi de “nojenta”. A única sister a ficar realmente nua de maneira tranquila foi a espanhola Noemi, que dispensou o biquíni para o banho em sua visita ao reality brasileiro. “Você toma banho de roupa? Eu também não”, explicou ela, “devidamente” tarjada.
Na moral, até Pedro Bial se assustou quando uma moça da plateia apareceu completamente nua em sua direção, na eliminação de Harry no Big Brother Brasil 3. “Produção, produção”, gritou ele, enquanto a moça era coberta e retirada rapidamente do palco. A exposição do corpo foi mais chocante que a exposição da vida e dos valores.
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Lucas Barreto e Noemi tomam banho pelados e chocam participantes |
E O AMOR E O SEXO?
Após o bafafá em torno do assunto nudez, o diretor Ricardo Waddington declarou, no programa Vídeo Show, que os bailarinos nus trataram-se de um manifesto e acabou focando em outro tema. “Foi um ato político no sentido de as pessoas se assumirem como são. Não interessa se é um pouquinho mais barrigudo, menos barrigudo. Acabou a era do tanquinho”, disse ele.
Porém, a ousadia ficou apenas no ao vivo.
O site oficial da Globo VETOU a cena de nudez, colocando estrelinhas na genitália dos peladões [veja abaixo] – fato que lembra a censura que ocorreu na abertura da novela Brega & Chique [Globo, 1987], em que o modelo Vinícius Nannes andava nu de costas e, depois da estreia bombástica, teve uma folhinha verde estampada em seu bumbum. Tudo para evitar interpretações erradas em torno do corpo.
Pois é, o castigo da nudez demorou, mas chegou – em pleno 2013!
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Entenda a Classificação Etária:
L – Livre: Não expõe crianças a conteúdos potencialmente prejudiciais. Exibição em qualquer horário
10 – Não recomendado para menores de 10 anos: conteúdo violento ou linguagem inapropriada para crianças, mesmo em menor intensidade. Exibição em qualquer horário
12 – Não recomendado para menores de 12 anos: as cenas podem conter agressão física, consumo de drogas e insinuação sexual. Exibição a partir das 20h
14– Não recomendado para menores de 14 anos: conteúdos mais violentos e/ou de linguagem sexual mais acentuada. Exibição a partir das 21h
16 – Não recomendado para menores de 16 anos: conteúdos mais violentos ou conteúdo sexual mais intenso, com cenas de tortura, suicídio, estupro ou nudez total. Exibição a partir das 22h
18 – Não recomendado para menores de 18 anos: conteúdos violentos e sexuais extremos. Cenas de sexo, incesto ou atos repetidos de tortura, mutilação ou abuso sexual. Exibição a partir das 23h