A comunidade trans da Índia não está nada satisfeita com a Lei de Pessoas Transexuais de 2016, que ainda deve passar pelo Senado, e que tem como premissa “proteger os direitos das pessoas trans”. Segundo ativistas, a legislação é discriminatória e traz uma série de exigências transfóbicas.
Tudo porque, para serem reconhecidas como “terceiro gênero” – sentença que ocorreu em 2014 – elas terão que abrir um processo administrativo, enviar um pedido ao tribunal e serão obrigadas a terem suas identidades avaliadas por um comitê formado por um médico, um psicólogo e um funcionário do governo. Elas reivindicam o direito a autodeclaração.
“Não parece uma lei de proteção, mas sim uma violação dos nossos direitos como seres humanos. O que mais me chocou foi que vão formar um comitê de revisão, que decidirá por nós se somos ou não trans”, declarou Chettri à Agência Efe. Ela declara que a própria pessoa tem o direito de dizer qual é a sua identidade e se preocupa com a demora de todo o processo, uma vez que o sistema de saúde indiano seria lento.
Outra reivindicação ocorre nas definições que aparece na lei. Segundo ela, uma pessoa trans é definida como uma pessoa “nem totalmente feminina nem masculina, ou uma combinação de feminino e masculino, ou nem feminina nem masculina”. “Que significa isso? Não entendemos a definição. Eu, como uma mulher trans, não quero ser chamada de homem. Eu me identifico como mulher. Que mal há nisso”, questiona a ativista.
Até o momento foram feitas 27 mudanças na lei, mas ainda está negado o direito de se autodeclarar. É por isso que no fim do último ano, ocorreu um protesto em Nova Délhi, em Jantar Mantar, com dezenas de pessoas trans de toda Índica demonstrando rejeição unânime à legislação.
Segundo o censo da Índia, há 500 mil pessoas trans. Ainda que seja consideradas como gurus em uma tradição por meio das hijras, que abençoam recém-nascidos e casamentos, a comunidade trans sofre discriminação. Muitas são excluídas da sociedade desde pequenas, e acabam sendo obrigadas a viver em comunidades próprias, sem acesso à educação e sem o apoio da família biológica.
“Tentamos levar uma vida digna, mas a maioria das transexuais na Ìndia realiza trabalhos sexuais ou pede esmola”, declarou a ativista Grace Banu.
Grace reivindica cotas nas universidades para que a população trans possa conseguir ter subsídios para entrar no mercado de trabalho. “As cotas são o nosso direito básico”, declarou ela, ressaltando que a prática de reservar trabalhos e lugares na universidade é garantida pela Constituição de 1950, para retificar a enorme e milenar discriminação que os elos mais baixos do hierárquico sistema de catas hindus e os grupos tribais tinham sofrido.
Apesar das críticas à lei, a expectativa da militância é que por meio do ativismo e das críticas, haja transformações positivas nos direitos da população trans indiana. E que a lei seja adaptada às reais necessidades do grupo.